hideaki anno, vihhtube


 1.

Amiga do Inimigo (2020)

A Youtuber Vitória Moraes vem se consolidando como uma jovem estrela de filmes b infanto-juvenis. Antes, aparecia como protagonista de webséries que andavam atrás do limbo pós-novelinhas sbt, e agora surge refilmando essas histórias em longas para serviços de streaming. 

Amiga do Inimigo é habitado por secundaristas e moldado na mitologia da classe média endinheirada intercambista (férias na disney, vodka na mochila, festas de debutante, sítios, contas secretas de instagram). Não à toa, o conflito comum de todos os seus personagens é a humilhação pública através da exposição internética de suas intimidades, o aspecto mais constantemente dramático do longa. O maior horror de todos é ter suas imagens associadas ao ridículo (o filme tem umas 3 cenas focadas em vômito, o que deve apontar alguma coisa). É uma mistura bastante curiosa (mas frustrada) entre a escola audiovisual da TV aberta e a linguagem youtuber, com personagens apresentados e resumidos da forma mais objetiva possível pra não perder tempo em amplificar seus apelos melodramáticos enfadonhos.

O que acaba sendo mais interessante, dentre uma trama intricadíssima e quase ininteligível, é como o filme fica sempre a serviço de pretextos bastante específicos. Parece necessário que haja um engajamento prévio entre o espectador, o grupo de jovens atores (suas personas influencers) e a história que eles buscam remendar. Nesse aspecto, talvez Amiga do Inimigo seja o produto de nicho mais direto já financiado por empresas como a Netflix, que sempre investem nos algoritmos planificadores, buscando sozinho um público que já espera conhecer. Qualquer que seja o grupo de seguidores que esse thriller adolescente bizarro almeja alcançar, ele existe, e parece estar disposto a embarcar em experiências um bocado não-naturalistas.


2.

Re:Cutie Honey (2004)

Em 2004, Hideaki Anno realizou duas adaptações do mangá Cutie Honey, de Go Nagai: um live-action e um anime dividido em 3 episódios. Nesse segundo, ao lado do grupo com que trabalhou nos rebuilds de NGE, Anno reimagina o mangá setentista numa aventura mecanizada histriônica que vai de Yaoi Kusama com Sailor Moon pra algo como Astroboy pelas vias de The End of Evangelion

A andróide Cutie Honey, guerreira do amor, vive um romance com uma detetive de polícia enquanto busca derrotar suas inimigas/irmãs em batalhas comandadas pelos limites físicos de seus corpos femininos mecânicos e suas cores explosivas. Anno centra todo o movimento do anime nos entrelaços corporais de andróides monstruosas, na luta de Cutie Honey por sua individualidade contra um coletivo iônico/matriarcal de robôs-mulheres-demoníacas. 

As origens na ingenuidade erótica dos mangás de Go Nagai abraça as grandes tragédias gregas de Anno, onde a exarcebação da libido e a hiperssexualização nuclear das andróides quase sempre acabam em grandes vazios existenciais gráficos (aqueles salões que viram buracos-negros). Especialmente em seu terceiro e último episódio, tudo caminha pra uma condenação absoluta da humanidade acontecendo em conjunto com a busca de Cutie Honey por sua própria condição enquanto ser. Felizmente, tudo isso é rompido e derrotado, em um reencontro final com as formações cósmicas e fantásticas que revertem a noção da realidade para encontrar o ingênuo inicial. Meninas mágicas podem ser felizes novamente, sem grandes compromissos com o caos de seu universo interior.



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